sábado, 13 de novembro de 2010

"Retrato frio" - parte 5 de...

"Minha velha e querida Praga..."

Foi com algum espanto, devo dizer (para quê mentir!?) que recebi um convite de uma sala incrível do mundo do espectáculo, a Ópera de Praga convidou-me para um recital que ia acontecer em Janeiro... Sempre tive Praga no meu coração, aliás, lembro-me que foi em Praga e na República Checa que passei uma das melhores férias da minha vida, com a Joana, a minha primeira namorada. Não me lembro de ter tido uma miúda como ela, era mesmo sensacional como pessoa e sobretudo como AMIGA. Até há bem pouco tempo ainda falava com ela quando vinha ao Porto jantávamos sempre e ficava em minha casa, até tomava conta do meu filho, pouco tempo depois de ele ter nascido para a Teresa poder assistir a um recital meu na Avenida da Boavista.



O recital que eu tinha de preparar era sobre autores e compositores checos, Kafka sempre foi um dos meus autores preferidos (em termos literários), em termos musicais conhecia poucos checos... mas lá fui investigar o que havia na biblioteca onde guardo, religiosamente e alfabeticamente as obras musicais. Lembro-me que liguei para a minha primeira professora de piano, a professora Helena do Conservatório de Música do Porto e ela lá me deu umas indicações sobre que obras e estudos tocar... Sempre gostei dela, muito atenta nos meus erros (isso era o lado menos positivo, pelo menos na minha tenra idade), aconselhou-me:



- Bedrich Smetana (por muitos considerado o PAI da música checa, foi ele o compositor da famosa peça "Má Vlast", traduzindo dava "Minha Pátria" e que evocava o Rio Moldava, o rio que atravessa Praga que é tão famoso...

- Antonin Dvorák (compositor checo do período romântico que usou nas suas obras muitas melodias populares da Morávia e da sua Boémia natal.


Escolhi o tema principal do Bedrich e de Antonin seleccionei "Danças Eslavas", eram temas bastante alegres e quis na altura convidar Sofy Vlag, uma pianista exímia no clássico e romântico... Encontrei-me com ela, por acaso numa noite do Porto, ela estava cá para fazer um recital com a Orquestra Nacional e eu andava a passear-me pela Foz. Era uma referência para mim, apesar de eu ser mais velho. Aceitou desde logo o convite... Eu estudei outra vez sobre Praga para saber onde ia voltar a passear, escolhi o hotel, fiz as malas com a Teresa e partimos... Já estávamos habituados a estas andanças mas estávamos longe de imaginar o que nos ia acontecer quando chegamos a Praga... Limousine, shouffer e suite presidencial. Foram os dias mais felizes das nossas vidas. Éramos o mundo, tínhamos o mundo aos pés... Bastava estalar o dedo que tínhamos o que queríamos. Jantámos por Praga no hotel na primeira noite, a viagem apesar de não ser muito longa foi atribulada... Voltámos a captar umas imagens na zona do Rio Moldava, com o incrível palácio no pano de fundo. Éramos mesmo apaixonados por aquela cidade e queríamos viver ao máximo aqueles momentos a dois, enquanto eu tinha um tempo... Foi então em Praga que falámos sobre o futuro, casar, ter filhos, ter uma casa com piscina, eram os nossos sonhos, iguais a tantos outros casais. Falámos sobre paixões antigas e aventuras, romances e paixões de verão, e eu contei-lhe sobre uma aventura em Brasília aquando da minha passagem pela capital do nosso país irmão para entoar os sons da "Garota de Ipanema" e outros temas do Tom Jobim e Vinicius de Moraes, na altura falei com Marília Gabriela para a "Rede Globo", tinha conhecido uma brasileira no bar do hotel, tomámos uma cerveja e mais umas caipirinhas e tivemos uma noite de paixão. A Teresa contou-me de um engate numa noite de verão no velho Swing na Foz com um italiano de seu nome Marcello. Fiquei tão curioso com a história que qunado cheguei ao quarto do hotel comecei a escrever algo sobre isso, sobre os romances de verão no tempo em que não se dizia a palavra NÃO!

Fiz o primeiro ensaio com Sofy Vlag na quinta-feira depois de almoço, tinha umas mãos como eu nunca tinha visto numa mulher... Dedos compridos, movimentos rápidos mas seguros, tensos mas suaves nas teclas do steinway que eu tinha pedido. Foi uma tarde agradável de trabalho, partilhámos segredos, descobrimos gostos em comum, ela também era do Futebol Clube do Porto e tinha uma curiosidade sobre a vida e obra de Smetana. Jantei com a Teresa e convidámos a Sofy para uma taça de champanhe no hotel depois do jantar. Ela compareceu imperetrivelmente às vinte e duas horas com o namorado e também músico, David. Foi um serão agradável que acabou no piano do hotel: um "concerto" a quatro mãos, eu e Sofy enquanto que a Teresa e David conversavam... Nunca fui possessivo nem quis ser controlador mas o que é certo é que senti o meu lugar ameaçado por algumas vezes... Eu sabia que a Teresa me amava mas podia uma amizade tornar-se numa "paixão numa noite de verão"... No caso nem podia ser porque estavamos em Janeiro... O recital foi incrível, fui muito bem recebido pelo público checo, que desde logo comecei a perceber que tinham algumas parecenças com o público do Norte do meu Portugal, o meu tão aclamado Porto. A noite correu tão bem que fui convidado a permanecer mais uns dias e fazer um concerto com a orquestra sinfónica de Praga, devo dizer, que esse era um dos meus sonhos: tocar com uma orquestra de renome internacional, não desfazendo a "minha" do Porto.

Foi nessa noite... na noite em que pensava que seria a nossa útlima noite que fizemos amor e foi nesse momento que percebemos: era altura de dar o nó. Aproveitámos a estadia em Praga e tratamos tudo às escondidas da família e dos amigos, quisemos ser níos a escolher tudo... Desde roupa a convidados. A minha velha e querida Praga ficaria marcada para sempre, novamente na minha vida. Foi aqui que tudo começou.... Que nós geramos uma família.

Sem comentários: